quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Tinha-nos dito o funcionário da bilheteira da FNAC, um jovem lisboeta gorducho e de rastas enroladas num carrapito, "esta nova formação dos Dead Combo, alargou muito a faixa de idades do publico, de maneiras que vai ser uma cena bué de povo, tas a ver?".

Apesar de não termos chegado a acordo quanto á questão da largura da faixa de idades do público, o que é facto é que ainda nos estávamos a aproximar do Cinema São Jorge, pelos jardins da Avenida da Liberdade, numa noite amena e calma de Outubro, e já tinhamos a certeza de que iria estar muita gente na sala.

"Estamos estúpidos da cabeça", viria a confessar Pedro, a meio do concerto. A sala estava cheia que nem um ovo, e eles não o esperavam, "juro que não entendo como é que vocês aturam isto" deixou Tó escapar entredentes, depois de mais uma ovação de pé...

O que é facto é que tudo aquilo parecia muito genuíno e feito por puro gosto, precisamente o oposto da musica que se faz tendo em alvo justamente certas fatias demográficas e públicos alvo... e funciona, os ouvidos e os olhos sentem isso... e gostam.

A certa altura lembrei-me que se o "Dean Moriarty" do Keruac estivesse ali, estaria no seu estado semi-transe, suor na testa e veias do pescoço salientes, murmurando:
sim,sim, eles têm-no... vá sopra! Eles têm a intuição do tempo... sim, sim...

As guitarras aceleravam e a orquestra das caveiras soprava!
Não era o Bop do Dean, mas era um universo igualmente frenético, tenso e carregado de ambientes em que o chão é escorregadio e húmido, a luz é só meia e as personagens são parcas em virtudes. Músicos entravam e saiam do palco, oscilando desde o duo de guitarras tocadas tete-á-tete e uma uma cortina de som produzida por 7 instrumentos.

Fiquei com a ideia de que para os Dead combo, depois de tantas bandas, projectos e anos a fazer musica de acordo com os seus conceitos estéticos e culturais, aquela era a primeira vez que sentiam, o feed-back, o reconhecimento, o OK, estes tipos estão a dizer algo... mas que para eles era estranho que desta vez resultara tão bem e isso estava á vista naquela sala repleta.

De facto, ao reentrarem em palco para um encore bem implorado como convém, veio a confirmação:

"Andamos nisto e uma manhã acordamos e enchemos o S. Jorge, obrigado por terem vindo, não estávamos á espera, eu costumo dizer aos meus filhos que o que é importante na vida é fazermos o que gostamos, custe o que custar, e vocês devem dizer o mesmo aos vossos"

Fomos para casa e fiquei com isto na cabeça... fazer o que gostamos... realmente não há nada melhor, até parece que as peças se encaixam sozinhas...